Geoff Johns, no início da primeira década do século XXI, fez algo realmente admirável: ele inseriu no contexto ficcional da DC Comics o tríplice pilar que qualquer leitor já conhecia. É de sua responsabilidade o pensamento, apenas sugerido em outros tempos, de que Superman, Batman e Mulher-Maravilha seriam os pilares de constituição de personagens dentro daquele multiverso ficcional. Ou seja, em alguma medida, todas as personagens da editora têm uma relação direta ou indireta com a Trindade. A primeira vez que vemos isso é em sua investida nos Novos Titãs, lembrem-se que a base é feita por Robin (Drake), Superboy (o Clone) e Moça Maravilha (Cassandra), as contrapartes infanto-juvenis de Batman, Superman e Mulher-Maravilha. Além disso, a única personagem com regalias dentro desse multiverso – não se relacionando diretamente à trindade – é o Flash. O motivo é simples, caro leitor, o Flash é um elemento de comunhão entre as barreiras do multiverso.
Não podemos esquecer que, ao mesmo tempo em que Johns foi alcançando cada vez mais espaço na editora, mais ele ia se tornando a peça fundamental para o atual esquema de organização ficcional do Multiverso DC. Ele reinseriu o conceito de multiverso, ele reinseriu a importância da Trindade na organização da editora, ele tomou para si o encargo de reorganizar a origem do Superman (que fora abalada por duas outras tentativas de adequação da personagem que apenas inseriram novos dados , bagunçando tudo). E é ele o principal arquiteto desse relaunch. Se prestarmos bastante atenção, o grande feito de um relaunch nesse tipo de negócio transforma-se em um duplo viés: ao mesmo tempo em que se reorganiza o universo para chamar a atenção de novos leitores, se reavalia o papel do fã de determinado personagem, pois este estará vigilante para perceber tudo aquilo que foi reutilizado e tudo aquilo que foi descartado nesse processo.
Apesar de Johns ter estabelecido que a base de todo Multiverso DC são as versões da Trindade de cada universo, tudo resume-se ao Superman como elemento messiânico, Batman como a controvérsia desse elemento e a Mulher-Maravilha como elemento de equilíbrio pelos dois. Ou seja, claramente o Superman é a base para a estruturação de qualquer herói da editora. Tendo isso em mente, partamos à tentativa de análise das imagens de Ang Morales/Grant Morrison e Jesus Merino/George Pérez. Como se trata de traços bem marcantes não será necessária da diferenciação dos desenhistas, correto? Aos leitores iniciantes: a imagem da dupla Pérez e Merino é a segunda da sequência, aff…
O que me parece incrível, num primeiro momento, é a diferença gritante de arquétipos envolvidos no desenho. Enquanto Morrison mostra-se mais ligado a um modelo de humildade em meio a representação de força, Pérez evidencia o caráter heroico padrão da personagem. Na primeira imagem, temos uma personagem que, apesar da grande força – afinal, está a levantar uma rocha e tem seus olhos a brilhar – veste-se praticamente maltrapilho e com elementos do meio-oeste (rural) americano. Segundo as palavras do próprio Morrison (agradecemos ao Multiverso DC pela tradução):
O uniforme tem que ter um significado. A capa é a única coisa que ele tem de Krypton, é um objeto muito importante. (…) O Superman está de volta à Era de Depressão na qual foi criado, mas atualizado para a nossa Era de Depressão…
Talvez essa seja a realização mais importante de Morrison, ao assumir que os Estados Unidos estejam numa nova Era de Depressão, o Superman de fato ganha importância messiânica, não tão óbvia quanto fora nos anos 1990/2000, mas muito mais simbólica no que tange ao humor do público médio estadounidense. O que estamos vendo, nesse aspecto e levando-se em consideração a fala do autor é que Superman estará mais ligado ao dia-a-dia do povo que ele representa. Isso só ocorreu nos primeiros anos da personagem, em 1938 a 1945. Depois disso, fora ladeira abaixo e representação mais ligada aos poderes em si. Somente a partir de 1984, com Byrne, Superman começou a desenvolver-se sobre outro aspecto, mais ligado ao que ele representaria para uma geração que via os Estados Unidos da América se tornarem de vez a Nova Roma (sobre isso, estudem Baudrillard). Ou seja, temos de esperar, com certa ansiedade, pelo que virá…
A diferença entre Morrison e Pérez nas histórias, para efeitos de cronologia é de 5 anos. Ou seja, para Pérez, a personagem já está estabelecida em Metrópolis e terá loucas aventuras… A imagem deixa claro somente uma coisa – Superman será uma personagem mais fraca em comparação a todas as outras versões, pois, ao utilizar uma armadura a fraqueza da personagem está exposta para quem quiser notá-la. Não creio que isso seja uma boa escolha, mas é um reflexo de tempos depressivos em que o imaginário tende a enfraquecer seus principais símbolos relacionados à força e à vontade.
Se o Superman está mais fraco, o que podemos dizer sobre a Mulher-Maravilha? É o que tentaremos responder na semana que vem, com mais um especial sobre o Realunch…
Inté.
Cara, li outro dia que a armadura é apenas uma roupa kryptoniana, sem uma aplicação prática pro Super, pelo visto. Como não saiu nada do novo UDC, ainda, é possível que criem uma situação que obriguem o personagem a usar uma armadura (algo na fase MST do Morrison), talvez. De qualquer forma, teríamos um problema: se precisa proteger o corpo, pq não a cabeça?
ResponderExcluirAnem! O Superman tem que ser muuuuito poderoso, senão nem tem graça. Eu acho que enfraquecem o super-homem por medo de não dar conta de escrever pra ele, só pode. Escritores covardes!
ResponderExcluirNa verdade, ele não precisa ser muito poderoso. Somente um dos mais poderosos daquele Universo ficcional, entende? Até mesmo porque, nos primórdios, o Superman não tinha nem metade da gama de poderes que ele tinha até o Relaubch.
ResponderExcluirMas o que mais me impressiona é que o Super é uma espécie de inspiração para os outros heróis dentro do Universo DC até então. O que farão com essa característica dele após o Relaunch? A primeira edição de Justice League (que saiu ontem) deixa essa dúvida no ar...
Abraços.