22 de março de 2012

Vale Tudo e sua relevância para o mundo nerd (parte 01)

Artigo originalmente publicado no blog PIRARPG, editado pelo autor.

No último 14 de julho, chegava ao fim mais uma reprise de Vale Tudo. Pela primeira vez, pude rever a novela que encantou milhões de pessoas nos anos de 1980 na Rede Globo de Televisão. Muitos de nós, inclusive este que vos escreve, não vão lá muito com a política de entretenimento e informação da dita cuja. Com seu já desgastado epíteto de “formadores de opinião”, por exemplo, a própria emissora distorceu os eventos dos caras pintadas ocorrido em meio à zona política que era o Brasil em 1991/2. Na realidade, aquele movimento queria tão somente melhores condições para escolas públicas e um maior rigor com relação à cobrança de parâmetros das escolas privadas. Mas essa é uma outra história, venho hoje conversar com os leitores sobre Vale Tudo.
Temos de relembrar o palco histórico com o qual essa novela estabelece diálogo para que seja possível um mínimo de comentários sobre as personagens e a trama principal da história (que não é “Quem matou Odete Roitman?”). Com o fracasso do movimento Diretas Já (1983-4), o Governo Militar brasileiro desistira de impor ao povo um esquema ditatorial de controle do país. Irônico, não? A mesma força que dominou o Brasil por diversas vezes (1822, 1889, 1930, 1964), sendo traída em algumas delas (1822, 1930), agora estava simplesmente deixando a manga chupada e podre chamada Brasília para uma organização “democrática e civil”. Aproximava-se o final do Governo Sarney que, por falta de um controle maior da economia (que deveria ter sido mais conservador e ditatorial com relação à moeda), teve de promover uma enorme coleção de nomes de Planos Econômicos, tipos de cédulas e nomes os mais doidos. A única coisa que tínhamos que se aproximava da ideia de um super-herói nacional era a super-inflação que, de um dia para o outro, aumentava os preços de tudo em 400%.

O país estava em crise, mas algumas coisas estavam se firmando no contexto nacional. Somente nos anos de 1980, a Rede Globo conseguiu uma pretensa hegemonia nos meios de comunicação nacionais com a venda para pequenas emissoras regionais de seus principais programas (novelas e Jornal Nacional), casando isso com a seção de tecnologia de uma geração anterior para essas emissoras, nascendo fortemente a noção de “afiliadas”. Dessa forma, o Brasil que era ainda um país muito ligado ao rádio, torna-se o país da televisão em apenas 10 anos. Além disso, uma transformação estava ocorrendo no interior de um dos núcleos mais queridos da emissora de Roberto Marinho...

Após a segunda metade da década de 1980, uma parte importante do staff das novelas estava começando a se renovar: antigos colaboradores estavam simplesmente derrubando os autores e diretores principais de todos os núcleos da Rede Globo (18h, 19h, 21h). Assim, as novelas estavam repentinamente se oxigenando, transformando-se em algo mais experimental, com controle dessa nova safra (Daniel Filho, Dênis Carvalho, Gloria Perez, Gilberto Braga, Manoel Carlos, entre muitos outros). Sabemos hoje que essa Era de Prata das novelas brasileiras foi marcada por uma série de acordos perpetrados pelo Presidente das Organizações Globo com relação à manutenção de sua hegemonia nos acordos de concessões de meios de comunicação no país, mas o que realmente interessa é o quadro geral que permitiu o aparecimento do risco que foi Vale Tudo e de sua pretensa adoração pelos cult-bacaninhas de outras gerações.

Estávamos, pois, num período em que as novelas experimentavam novos rumos. Formalmente, o formato é o mesmo, mas, do ponto de vista temático a exploração era mais abrangente. Nesse contexto, em 16 de maio de 1988, iniciava-se Vale Tudo. Gilberto Braga, Aguinaldo Silva e Leonor Bassères – três colaboradores dos anos de 1970 – estavam a cargo dos roteiros, enquanto Dênis Carvalho e Ricardo Waddington cuidavam da direção da novela – também antigos colaboradores e assistentes de direção dos anos de 1970. A novela era uma renovação no seu staff de comando e não poderia ser diferente, pois Vale Tudo é uma narrativa cujo tema central é a corrupção desenfreada no país. Simplesmente, nenhum personagem se salva de meios corruptos ou do “jeitinho brasileiro” para conseguir se dar bem na vida.

Na próxima semana, segue a segunda parte…


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